domingo, 9 de setembro de 2012

De quase em quase

Ela preferia o pó dos espelhos quebrados aos cacos grandes. Achava mais prático jogar os pedaços maiores no lixo e ficar com os resquícios brilhantes, que quase pareciam purpurina.

Porque será que ela não se livra de tudo?

Eu costumava pensar que quando alguma coisa quebra, não existia uma cola pra dar jeito. E eu pensava certo.
O problema era achar ser o fim da linha. A moça tão prática me disse que de quase em quase as coisas se tornam, se você não para de tentar.
Ela preferia o pó de seus espelhos quebrados porque certamente virariam purpurina no fim das contas. E os cacos grandes eram como eu pensava ser: sem jeito.

sábado, 1 de setembro de 2012

É o trato

Enquanto eu souber tirar as pedras dos meus próprios sapatos, estarei sã. O que acontece quando eu percebo tarde demais que ficou um pouco de areia neles é que eu não sei. Quanto à autossuficiência que eu sempre quis mostrar pra mim mesma, desminto agora. Desmascaro todas essas grades que eu sempre pus pra me proteger. Que tipo de dona de casa instala cerca elétrica por medo de si própria?

"I'm titanium", droga nenhuma. Carne. Carne e osso. "I'm bulletproof", nunca serei. Eu costumava repetir isso pra mim, de ser de titânio, de ser a prova de balas e que um dia seria imune. E de que é que adianta as armas de São Jorge nesse mundo? Escudo, espada, servem de nada. Ter que montar no dragão, aprender a domar. Adianta?


Tem coisa que faz a gente sentir como se perdesse o dente da frente.

Mas aí, outro dia lendo umas coisas de familia, lembrei do que meu pai dizia: "O sorriso, esse é o trato!"
Daí fica fácil matar um leão por dia, o que faz parecer domar dragões ridículo. A armadura de São Jorge eu troco pela proteção do Anjo da Guarda. A terra nos sapatos se acumula virando pedra novamente, e eu vou saber tirá-la. Ou então continuo descalça, não vejo problemas nisso.
Nem tudo se resolve assim, mas o sorriso, lembra? É o trato!

segunda-feira, 26 de março de 2012

Vinil

Eu acredito que nós somos feitos do que os momentos fazem. Cada fragmento dos instantes. A partir das pausas e não da continuidade da rotina. É aquela fugidinha do normal. E basta ter amigos, não é preciso que sejam muitos, só que sejam de verdade. Depois disso você entende.
A tua sala grafitada e os seus discos todos encostados na vitrolinha, toda retrô. Todas as saídas que lotaram de histórias memoráveis. Cada parada em todo posto, cada risada e as conversas que a gente diz ser cabeça. A sua mesinha de centro improvisada e a caixinha em detalhe preto em branco sobre ela. O sofá que ainda não existe, e a gente sentado no chão, se sentindo em casa. Sem sapatos, tocando violão e trocando as velhas ideias. A guitarra em tom de creme, encostada no canto da parede junto ao skate, todo em madeira. E eu lembro que deixei um aviãozinho em seda, pra você lembrar da gente. E os seus óculos de Lennon, junto aos meu de Joplin. E eu lembro de ter deixado alguns fios de cabelo pra você lembrar da nossa amizade de vinil, nascida sei lá de onde.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Topo do mundo

É no topo do mundo onde eu me sento pra descansar, ninguém me toca e ninguém me alcança. Pastoreio com calma as ovelhas que decidiram permanecer e vejo até com ar de normal o lobo na pele de lã.
Me sento no pico do universo que é pro vento bater na cara, sem nem me importar com o cabelo emaranhando, só e unicamente olhando pro mar tão infinito de azul. Quase que em nirvana, costumizando cada dia como as fotos organizadas em um álbum. E quase que sem ar, maravilhada, respirando o sopro da vida que passa cantando mansinho:
  "mergulha em mim, porque também és minha filha."

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Frisson

Fiquei assistindo a um filme, dia desses. Filme bobo, em que eu me distraio mais com o sorvete que eu comprei. Mas entre frase e outra, o protagonista soltou uma que me deixou atenta: “A vida não é feita dos momentos em que você respirou, mas sim dos momentos em que você perdeu o fôlego.”.  E nunca ouvi tamanha verdade. Pode até ser que seja só na minha vida, mas a falta de ar é o que conta.

O arrepio na espinha, o coração feito escola de samba. As mãos suando, perna bamba, sintoma que parece de doença. Estômago com uma dúzia de borboletas. O gosto de energético que tem o escondido, o desconhecido. Um segredo, alguma aventura. O beijo, o corpo. A sensação. Um porre, uma amnésia. Entrar em casa na ponta dos pés. O frio na barriga que uma situação te deixa igual montanha-russa. A paixão platônica, a que você fez de meta. A meta que você cumpre, não a que deixa pela metade.

E depois de tudo isso, a vidinha normal. Os estudos, o trabalho, a família. A tranquilidade e estabilidade. Mas nada que consiga apagar o acervo de memórias que você junta desde os primeiros passos, e a quantidade de histórias pra poder contar. 

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

(Dez)ejo.

É, te desejo tudo em dobro. Que a felicidade te acompanhe como um melhor amigo, que a saude seja teu sustento. Menos computador, havendo distância, escreve uma carta, do seu jeitinho. Desejo uma praia enorme pra você, um "time" do escritório, livros e isso que te prende numa salinha apertada. Um mergulho nos abraços, que tu caibas dentro de todos. Quero te ver de camisa amassada, mostrando quem esteve contigo. Um celular com algumas mensagens, algumas chamadas, só pra você ver que tem gente. Uns trocados no bolso do jeans rasgado, pra garantir uma biritinha na esquina ou pra jogar na latinha do mendigo, eu lembro que isso te deixa leve. E falando em leve, leva contigo uma foto na carteira, eu sei que o seu relicário tá ocupado com a imagem dos teus pais. Uma mochila nas costas com mudas de roupa, pra lembrar o desapego dessa era, e fim. São os meus dez desejos pra você. 

Ah, e antes que um punhado de perguntas cheguem aqui, esse desejo é pra qualquer desconhecido que bata na minha porta. Ando destribuindo gentileza, sorrisos... Ando bem demais, e repetindo isso pra mim mesma.